domingo, 31 de outubro de 2010

Café da tarde

Ela secou as mãos no avental, ela amassava os dedos no tecido e arranhava sutilmente as unhas no pano. Mergulhou a mão esquerda no bolso da calça e tirou aquele maço prensado e magro, quase que só era papel; em seguida prendeu um cigarro entre os lábios, acendeu com um isqueiro laranja e jogou ambos, o maço e o isqueiro, sincronizadamente sobre a mesa. Tragou a primeira vez, ergueu o rosto pra mim e movimentou a cabeça de modo que a franja se deslocou para o lado: uma mecha fez uma curva mais aberta e permaneceu acima do restante dos fios. Ela soprou a fumaça para cima, aquela fumaça fez piruetas no ar e deixou fosca a luz que delineava as panelas no fogão ali atrás. Agora ela me olhava.
- Acho que já sei exatamente o que tem me incomodado. Acho que agora podemos discutir direito, sem divagar, sem falar merda.
E depois eu só ouvi a fumaça que tragava ela. Mais nada.

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